Direito à cidade e mobilidade urbana para os idosos
Aluna de Direito analisou em que medida políticas públicas na área de mobilidade garantem mobilidade da pessoa idosa na RMC
O Estatuto do Idoso, de 2003, é uma das mais avançadas legislações especializadas na tutela da pessoa idosa na medida em que prevê uma rede de proteção para esta parcela da população e em que fixa direitos e deveres para instituições e para as famílias, inclusive com a possibilidade de haver penalidades. No entanto, muitos direitos ainda não respeitados, incluindo o direito à cidade. A pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Direito da PUC-Campinas, Fernanda Brancalioni Zerbini, escolheu como tema de sua dissertação de mestrado a mobilidade urbana para cidades sustentáveis como pressuposto à promoção de direitos humanos com ênfase na pessoa idosa. Defendida em dezembro de 2021, a pesquisa foi orientada pelo professor Claudio Franzolin.
Calçadas estreitas, desniveladas ou com obstáculos, transporte coletivo sem acessibilidade, tempo para atravessar as ruas mais veloz do que a média ideal para pessoas idosas: não faltam exemplos de situações contrárias à mobilidade segura das pessoas idosas. Segundo a Organização Mundial da Saúde, uma cidade amiga do idoso estimula o envelhecimento ativo ao otimizar oportunidades para saúde, participação e segurança, para aumentar a qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem. Em termos práticos, uma cidade amiga do idoso adapta suas estruturas e serviços para que estes sejam acessíveis e promovam a inclusão de idosos com diferentes necessidades e graus de capacidade. “O direito à cidade envolve não apenas a possibilidade de ter acesso a seus recursos, mas também a oportunidade de participar de sua construção, de usufruir dos espaços urbanos, como local de encontro. Para que isso seja viável às pessoas idosas, o espaço urbano precisa oferecer condições mínimas de segurança nos deslocamentos, sobretudo considerando a vulnerabilidade naturalmente advinda do envelhecimento”, afirma Fernanda. “Entre as recomendações trazidas pelo Guia Global: Cidade Amiga do Idoso, da OMS, considero urgentes que os ônibus disponham de rampa ou embarque de nível, que os motoristas sejam capacitados para atender aos longevos, que haja transporte público que contemple locais importantes ao público sexagenário, como hospitais, instituições de longa permanência, parques, locais de entretenimento, sobretudo os voltados à Terceira Idade, além de calçadas planas e amplas, evitando quedas e estimulando deslocamentos à pé, escadas com corrimões de apoio, entre outros”, destaca a pesquisadora da PUC.
Sustentabilidade
O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nº 11 relaciona o conceito de sustentabilidade à construção de cidades onde todos vivem com qualidade de vida, compartilhando prosperidade e estabilidade social, sem prejudicar o meio ambiente. Ao mesmo tempo, é preciso lembrar que assistimos a importantes processos atualmente, um intenso processo de urbanização (até 2050 a população vivendo em cidades deve duplicar) e o envelhecimento da população (em 2018, pela primeira vez na história, o número de pessoas acima dos 65 anos superou o de crianças abaixo dos cinco anos). No Brasil não é diferente. Segundo dados do IBGE, hoje a taxa de urbanização é de 84,4% e há projeções de que em 2043, ou em 21 anos, um quarto da população brasileira deverá ter mais de 60 anos, enquanto a proporção de jovens de até 14 anos será de apenas 16,3%. Um dos desafios das cidades é estarem preparadas para atender as necessidades da população idosa. Uma medida fundamental é a implementação de políticas públicas que atendam à Política Nacional de Mobilidade Urbana, que tem entre seus princípios a acessibilidade universal e a segurança nos deslocamentos.
Ao longo da pesquisa, Fernanda avaliou os planos de mobilidade urbana das cidades de Valinhos, Indaiatuba, Jaguariúna, Campinas, Sumaré e Nova Odessa buscando compreender em que medida eles contribuem para que a população idosa tenha seu direito à mobilidade urbana atendido. “Na Região Metropolitana de Campinas (RMC) ainda é incipiente a implementação dos nortes da OMS, havendo ainda, frequentes ambientes urbanos repletos de barreiras físicas, o que por vezes, acarreta isolamento e confinamento dos idosos em suas residências, favorecendo aumento de sintomas depressivos, doenças advindas do sedentarismo e até mesmo comprometimento de acesso a serviços imprescindíveis, como de saúde”, pontuou Fernanda. Ela lembra, no entanto, que Jaguariúna firmou compromisso de ser uma cidade amiga do idoso, comprometendo-se a promover maior acessibilidade a esse grupo. “Uma vez atendidas essas iniciativas de acessibilidade e de segurança, defendo que os municípios adotem políticas públicas que promovam mais qualidade de vida a todos, inclusive pessoas idosas, com incentivo a sua participação no espaço urbano, como as academias ao ar livre da Terceira Idade, criação de ambientes públicos mais arborizados e com mobiliário urbano que permita descanso aos idosos, como os parklets, sem esquecer de cursos voltadas ao público sênior, como o projeto da PUC-Campinas, que a tornou a primeira universidade amiga do idoso na América Latina”, complementou.
Por fim, ela ressalta a importância da sociedade civil como um todo na cobrança de meios de transportes e de espaços urbanos mais acessíveis, os quais vão atender não só às pessoas idosas, mas também pais com crianças de colo ou em carrinhos, pessoas com deficiência ou com dificuldade de locomoção. “Uma das pontes entre a população e os poderes públicos, em especial no município, seriam os conselhos municipais do idoso”, disse.
Atualmente, muitas cidades estão promovendo audiências públicas abertas à população para debater a aprovação dos planos municipais de mobilidade urbana, obrigatórios às cidades com mais de 20 mil habitantes e também àquelas pertencentes a regiões metropolitanas e áreas de interesse turístico, tal como previsto na Lei da Política Nacional da Mobilidade Urbana. “Essa é uma excelente oportunidade para verificar se a cidade está incluindo metas de acessibilidade, voltadas ao transporte dos mais vulneráveis, como a população idosa, finaliza.
Por Patricia Mariuzzo