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Pesquisa ressalta a importância da memória histórica em relação a indígenas em contexto urbano

Campinas é a terceira cidade com maior população indígena do Estado de São Paulo

Campinas é a terceira cidade do Estado de São Paulo com maior número de população indígena segundo dados divulgados pelo mais recente censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Uma pesquisa desenvolvida dentro do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUC-Campinas analisou como a memória histórica é um importante instrumento de resistência cultural contra a colonização por parte dessa população que vive em áreas urbanas. A tese “Psicologia e indígenas no contexto urbano: memória histórica como resistência” foi defendida por Mariana Feldmann sob orientação da Profa. Dra. Raquel Guzzo.

A ideia da pesquisa começou dentro do Projeto ECOAR, desenvolvido pela PUC-Campinas na Região Noroeste e com escolas municipais de ensino fundamental da região Norte. O projeto insere a psicologia na escola para acompanhar o desenvolvimento integral das crianças junto com professores e família com o objetivo de prevenção prevenir a violência e os riscos ao desenvolvimento.

“Com esse trabalho, identificamos várias questões que precisaríamos nos aprofundar, uma delas relacionada a relações étnico-raciais. As crianças não se reconhecem em relação à sua etnia, não se autodeclaram pela cor da pele etc. Com isso, seguimos com o trabalho nas escolas, mas identificamos em Campinas grupos indígenas no contexto urbano e fomos investigar como eles vivem. O trabalho de Mariana Feldmann foi no mestrado com as relações étnico-raciais na escola e no doutorado com os indígenas em contexto urbano. Nosso fundamento teórico é que a memória histórica se traduz em uma importante ferramenta de prevenção à violência de raça”, disse a orientadora Raquel Guzzo.

Foto: Indígenas do povo Yanomami – Fernando Frazão/Agência Brasil

“Percebi uma dificuldade  em lidar e falar sobre as relações étnico-raciais, tanto pelos estudantes como pelos adultos da escola. Isso me levou à iniciativa de estudar a importância da memória histórica como um caminho possível de fortalecimento dos indivíduos, principalmente pela população indígena, por estar próxima a essa realidade. Comecei então a pesquisar sobre esse tema no início do doutorado, partindo das minhas experiências com alguns coletivos de Campinas”, disse a pesquisadora.

Inicialmente ela constatou a importância dos espaços coletivos para o fortalecimento da identidade desses indivíduos. E também que havia uma carência de políticas públicas específicas, além da baixa produção científica na área da psicologia.

A pesquisadora conseguiu uma bolsa de estudos e foi para Nova Zelândia, onde pode conhecer as políticas públicas e pesquisas, principalmente na área de psicologia, voltadas para os povos indígenas locais. Também analisou sobre como as universidades recebem esses indígenas Maori e estão adaptando suas grades curriculares para atender a esse público.

Quando Mariana voltou da Nova Zelândia, começou a pandemia, e ela teve que modificar o planejamento de pesquisa. Começou a fazer acolhimentos, acompanhamentos por telefone e algumas entrevistas com os coordenadores dos coletivos. Com isso, levantou temas urgentes como ideação suicida, depressão profunda, falta de alimentação e outros problemas enfrentados por eles.

A partir desse material e de anotações feitas em experiências anteriores, ela procurou montar uma espécie de “mapa mental” com seis categorias principais a partir de temas que surgiram repetidamente nas entrevistas. Foram elas “Origem e ancestralidade”, “Movimento para a cidade”, “Trabalho comunitário/ coletivo”, “O ser indígena”, “A vida na cidade” e “Os impactos da pandemia na população indígena”.

Foto: Cadastro Único em Campinas / Etno Cidade / Prefeitura de Campinas

Entre as questões levantadas no estudo estão a razão deles virem para a cidade, como enfrentam os desafios nos centros urbanos, como são os trabalhos comunitários que desenvolvem. “Eles têm essa visão coletiva muito forte, como fundamento de vida E busquei conhecer o que é ser indígena na cidade, na perspectiva deles”, disse Mariana.

A ideia é que esse trabalho, futuramente, dê visibilidade à população indígena na sociedade em geral, e também na Universidade, entre os pesquisadores, profissionais de saúde, em especial de psicologia. “Discuto como podemos construir um trabalho com essa população, considerando suas diferentes cosmovisões e em busca de uma descolonização do conhecimento. Precisamos, junto com eles, construir diálogos entre as aldeias e a cidade, entre indígenas e não indígenas”, afirma.

Campinas já tem trabalhos voltados para essa população e que estão em desenvolvimento. Neste início de ano, foram iniciados cadastros específicos dessa população para tratamento e desenvolvimentos de políticas públicas de saúde, há um vestibular específico na Unicamp para indígenas e a cidade tem até um centro cultural próprio dessa população, o EtnoCidade.

“Existem indígenas que estão vindo para centros urbanos porque estão perdendo terras, fugindo de invasões e das doenças, e também aqueles que já nasceram nas cidades. Não é porque você está na cidade que deixou de ser indígena”, diz Mariana.

A pesquisadora diz que futuramente quer trabalhar em grupo sobre a memória histórica como uma ferramenta que contribua com esses   moradores que enfrentam diversas violências no cotidiano de vida nas cidades. Um trabalho a ser realizado com participantes de integrantes de coletivos de Campinas, com moradores de outras cidades da região e com os estudantes indígenas que estão vindo para a Unicamp.

Foto principal: divulgação/Sol Terena



Marcelo Andriotti
9 de fevereiro de 2023