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Professora do PPG em Ciências da Religião da PUC-Campinas participa de colóquio em universidade italiana

Ana Rosa Cloclet da Silva proferiu palestra sobre a imprensa católica ultramontana no século XIX

A Profa. Dra. Ana Rosa Cloclet da Silva participou, nos dias 16 e 17 de maio, do Colóquio “Le Saint-Siège et le Diocèse de Québec, XVIIe-XXIe Siècles” (em tradução livre, “A Santa Sé e a Diocese de Quebec, Séculos XVII a XII”), realizado na University of Notre Dame, em Roma, na Itália.

A partir da análise do jornal católico Le Courrier du Canada, publicado sob os auspícios do Arcebispado de Quebec entre 1857 e 1901 e um dos principais representantes da tendência ultramontana do Catolicismo oitentista (tendência católica reativa às transformações do mundo moderno, que buscava em Roma a sua principal referência), a pesquisadora e professora da Faculdade de História e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião (PPG-CR) da PUC-Campinas proferiu, durante o encontro, a palestra “La Presse Catholique Ultramontaine au Service de la Romanisation du Catholicisme au XIXe Siècle” (em tradução livre, “A Imprensa Católica Ultramontana a Serviço da Romanização do Catolicismo no Século XIX”).

A professora explica que o seu trabalho se concentrou na análise dos dois primeiros anos da edição do periódico, que teve como editor-chefe Joseph-Charles Taché. Profundamente influenciado pelo tradicionalismo católico francês (em especial, pelas ideias do jornalista Louis Veuillot, difundidas em seu jornal, L’Univers, publicado em Paris), Taché imprimiu ao Courrier du Canada uma orientação marcadamente antiliberal e ultramontana.

A Profa. Dra. Ana Rosa Cloclet da Silva durante a sua palestra, mediada pelo Prof. Dr. Philippe Chenaux.

“A exemplo de outros jornais ultramontanos publicados no período, procurei demonstrar como o Courrier du Canada desempenhou um duplo e paradoxal papel: de um lado, servindo como instrumento de divulgação das orientações emanadas da Santa Sé no contexto da romanização da Igreja Católica, quando diversas encíclicas papais condenaram a liberdade de imprensa e de consciência; e de outro, com o seu editor-chefe interpretando as orientações da Santa Sé à luz das prioridades e singularidades da Arquidiocese de Quebec e colocando o jornal analisado a serviço de um verdadeiro projeto civilizacional para a então província francesa do Canadá, o qual fundia nacionalismo e Catolicismo”, detalha Ana Rosa.

Fruto de parceria
Além de estar vinculado às suas pesquisas sobre a imprensa ultramontana publicada no Brasil da segunda metade do século XIX, o convite para integrar o evento é fruto da parceria estabelecida com pesquisadores da Université Laval, de Quebec, da qual resultou a coorganização do Colóquio Internacional “História do Catolicismo no Brasil: Debatendo as Múltiplas Faces do Intransigentismo”, sediado pelo PPG-CR da PUC-Campinas entre os dias 8 e 12 de maio de 2023.

Convite a Roma
Particularmente sobre a ida a Roma, a professora salienta que “a internacionalização da pesquisa não é algo que se constrói da noite para o dia. Assim, o convite para participar do Colóquio é resultado de uma profícua agenda de atividades que, desde 2020, vem consolidando a parceria acadêmica entre pesquisadores da Université Laval e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da PUC-Campinas. Esse diálogo tem sido alinhavado pelo interesse comum em compreendermos as múltiplas e variadas expressões do Catolicismo em nossas sociedades, considerando as suas diferenças, similitudes e possíveis conexões, além dos vínculos também diferenciados entre a Igreja Católica nesses países, suas respectivas dioceses e Roma, ao longo dos séculos”, esclarece a pesquisadora.

Religião e política
“Resumidamente, a ocasião representou um desdobramento de minhas pesquisas desenvolvidas no âmbito da Linha “Religião: Instituições e Discursos”, que buscam compreender os nexos entre religião e política no Brasil do século XIX a partir de suas expressões discursivas. A partir desse recorte, tenho analisado a contribuição brasileira para a constituição de uma rede semântica que integrava e diferenciava o mundo católico oitocentista através da circulação de impressos representativos da vertente ultramontana do Catolicismo”, elucida Ana Rosa.

Ela diz ainda que, desse modo, o escopo geral de suas pesquisas está inserido em um debate caro à área das Ciências da Religião e Teologia “ao procurar compreender o processo da secularização, não como suposta perda de importância da religião e seu recuo para a esfera da vida privada, conforme sustentado por uma determinada tradição sociológica, mas como resultado da própria agência dos atores religiosos, que, no decorrer desse processo, fizeram e fazem uso de diferentes estratégias para se manterem presentes no espaço público”.

Experiência rica e promissora
Por permitir o diálogo e o compartilhamento de perspectivas interdisciplinares sobre as relações entre a Santa Sé e o mundo católico, em diferentes épocas e contextos, a presença no evento se mostrou “riquíssima e promissora”, de acordo com a professora.

Ela comenta que, no que toca ao período contemporâneo, as falas do Cardeal-Arcebispo de Quebec, Monsenhor Gérald Cyprien Lacroix, e do Arcebispo Auxiliar de Quebec, Monsenhor Marc Pelchat, ofereceram uma perspectiva atual e elucidativa sobre os pontificados de João Paulo II, Bento XVI e Francisco, mostrando o quanto a Igreja Católica se revela uma instituição dinâmica e em constante processo de adaptação às transformações e demandas das sociedades.

A Profa. Dra. Ana Rosa Cloclet da Silva durante a sua palestra, mediada pelo Prof. Dr. Philippe Chenaux. Na tela, uma edição do jornal Le Courrier du Canada, objeto de sua fala.

Além disso, Ana Rosa esclarece que a experiência também foi desafiadora, uma vez que além de ser a única presença feminina a compor as mesas do Colóquio, foi também a única representante da comunidade acadêmica brasileira a ser convidada para o evento, colocando em evidência as contribuições de pesquisadores da área sobre o tema e, particularmente, aquelas desenvolvidas no âmbito do PPG-CR da PUC-Campinas.

Importância da participação
“A participação em eventos dessa natureza se revela ocasião propícia para o crescimento nos âmbitos pessoal, profissional e cultural”, segundo a pesquisadora. Em sua avaliação, a experiência relatada se revela em consonância com o escopo das atividades esperadas dos cursos de pós-graduação no país, “abrindo expectativas positivas para o desdobramento das pesquisas em nível de mestrado e doutorado em curso, bem como, para os respectivos projetos dos docentes do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da PUC-Campinas”.

 Ela menciona ainda que, desde o final de 2023, encontra-se em curso o estabelecimento de um Acordo Amplo de Cooperação entre a PUC-Campinas e a Université Laval, o qual, uma vez viabilizado, deverá proporcionar oportunidades futuras para o intercâmbio de alunos e docentes entre as duas universidades parceiras, contribuindo para a produção de conhecimento conjunto na área e a construção de espaços de diálogo intercultural.

Sobre o Colóquio
Organizado pelos professores Dr. Matteo Sanfilippo, da Università degli Studi della Tuscia di Viterbo, e o Dr. Philippe Roy-Lysencourt, da Université Laval, o evento teve como objetivo celebrar o aniversário de 350 anos da Diocese de Quebec, fundada em 1674, e contou com a participação de pesquisadores do Canadá, da França, da Itália e de outros países, além de representantes da Igreja Católica canadense em Roma, entre os quais, o Dr. Gilles Routhier, Secretário do Sínodo, Diretor do Seminário de Quebec e professor titular da Faculté de Théologie et Sciences Religieuses de Laval; o Monsenhor Marek Inglot, presidente do Pontifício Comitato di Scienze Storiche; e o já citado Cardeal-Arcebispo Monsenhor Gérald Cyprien Lacroix.

O Monsenhor Gérald Cyprien Lacroix, Cardeal-Arcebispo de Quebec, palestra sobre as duas visitas papais à Quebec: João Paulo II (1984) e Francisco (2022).

Os convidados procuraram abordar vários aspectos das relações entre a Santa Sé e a Diocese de Quebec (arquidiocese a partir de 1844), que continuou a expandir-se até o século XIX, antes de diminuir em território, em virtude do surgimento de novos distritos eclesiásticos sucessivamente erigidos na América do Norte.

Ultramontanismo
A definição de Ultramontanismo deriva da associação de duas palavras latinas (ultra + montes), significando “para além dos montes”, isto é, dos Alpes. O termo remonta à linguagem eclesiástica medieval e começou a ser usado no século XIII para denominar todos os Papas não italianos que eram eleitos.

No século XVII, a doutrina foi associada àqueles que defendiam a superioridade dos Papas sobre os reis e os Concílios, mesmo em questões temporais. No século XIX, o Ultramontanismo se caracterizou por uma série de atitudes da Igreja Católica em um movimento de reação a algumas correntes teológicas e eclesiásticas, ao Galicanismo (que minimizava a autoridade do Papa na Igreja e estabelecia que os costumes nacionais podiam superar os regulamentos colocados pela Igreja Católica) dos estados católicos, às novas tendências políticas desenvolvidas após a Revolução Francesa e à secularização da sociedade moderna.

Definiu-se, assim, como a tendência mais dinâmica do intransigentismo católico contra os supostos “erros da modernidade”, defendendo o fortalecimento da autoridade pontifícia sobre as igrejas locais e sustentando o dogma da infalibilidade do poder papal, decretado por Pio IX, durante o Concílio Vaticano I (1869-1870).



Daniel Bertagnoli
25 de junho de 2024